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Nesse curto período do tempo que envolve as gerações dos nossos pais e de nossos filhos, nos deparamos com um comportamento verdadeiramente preocupante dos jovens. Preocupante é o adjetivo correto porque não é natural.
Houve um tempo em que era natural se discordar e protestar. Ainda na nossa geração era fácil tomar partido de um ideal e brigar por ele. Divergiam as opiniões com muito alarido e às vezes turbulência, ao mesmo tempo em que se vivia uma sensação de ordem e paz, por se entender que o jovem é assim mesmo; quer corrigir desabaladamente o mundo e a sua opinião pessoal é toda a razão de ver e estar na vida.
Não pode haver esperança num futuro melhor se não acreditarmos piamente que podemos mudar e fazer melhor. Apaixonante esse papel do jovem em todos os tempos, que nos renova e inspira, mesmo que depois fiquemos mais velhos e, por causa disso, acabemos por não mudar tanto assim...
Tenho percebido que por alguma razão nesses nossos dias isso está mudando.
Recentemente, após um episódio de grande comoção nacional, motivo pelo qual em outros tempos haveria muita discussão, hoje em seu lugar, ouve-se um perturbador silêncio entre os jovens, nesse ou noutros assuntos de interesse geral. Fiquei estarrecido numa conversa sobre o assunto com um rapaz dos seus 20 e tal anos. Não há opiniões, ou pior, repetem-se as opiniões dos outros, ou na maioria das vezes, as opiniões da mídia que produz para o gosto do freguês. As raras discussões limitam-se a um bate-boca de lugares-comuns. Não se dão ao trabalho de pensar, ou mesmo muito pior, de sentir o que se está passando. Acomodam-se repetindo o que ouvem, consoante mais ou menos aquilo que acham ser o unânime, no lugar do mais certo. Um total alheamento.
Precisamos urgentemente de jovens contestadores! Em Portugal e em toda parte, a atual geração de jovens desincumbiu-se dessa função. O que poderia ter originado isso? Arrisco uma explicação.
Particularmente em Portugal, e extrapolando a ideia para outras regiões do mundo, a atual geração de pais que nasceu após a ditadura e a guerra colonial, teve a sorte de viver num ambiente mais democrático e de paz social, de mais progresso, nomeadamente no caso português o rápido desenvolvimento e a abundância surgidos com a entrada na UE. Esses pais que educaram seus filhos nesse ambiente de fartura, de ausência de dificuldades, de alto poder aquisitivo e consumismo exagerado, acabou por criar indivíduos alienados da parte ruim da vida que está aí, grita, berra e afunda nos botes para quem quiser ver...
Essa bonança do tempo naturalmente termina e quando chegar ao fim, vai acabar por bater na porta da formiga...
Espero sinceramente que não precisemos voltar a viver outras épocas de dificuldades para sermos obrigados a sentir na pele o desconforto e assim reclamarmos por melhores dias, voltar a protestar e querer reformar as coisas. Felizmente para os jovens portugueses não é preciso passar por isto; basta olhar à volta e ver que no mundo ainda falta muito para que todos, além de nós, possam viver bem. É só uma questão de atávico egoísmo. EGOÍSMO.
Ser reeducado não é fácil. Mais fácil seria pôr a mão na consciência e tirar os olhos do umbigo; pô-los nessa geração que vai nascendo agora, e desejar como pais amorosos que vão se tornando, que não venham a ser também ingênuas cigarras!
Aos jovens portugueses que me leem, lembro um sonoro verso do Zeca Afonso:
“Não me obriguem a vir para a rua gritar!

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