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Em tese, se pudermos extrapolar o comportamento de uma pessoa para o da sociedade, e se individualmente através da análise pudermos corrigir certos erros de comportamento, então a própria sociedade corrigir-se-ia. A noção da causa está na raiz da solução do problema; é preciso encontrá-la.
Nos dias que correm em Portugal, voltou-se a discutir o problema do desmando dos governantes e da inação dos governados. Em tudo semelhante ao Brasil, este problema não é novo e sempre volta à baila. É daquelas coisas erradas que reconhecemos em nós, mas que vamos levando, a espera que desapareça por si só. Nem com toda análise do mundo nossos problemas são resolvidos se não formos nós mesmos a querê-lo de fato.
Uma característica tão marcante desses dois povos, tão distantes quanto semelhantes, explica-se pela transmissão e arraigamento da cultura do colonizador em relação ao colonizado. Apesar da sociedade brasileira ter-se desenvolvido de modo único e peculiar, com sua formação multicultural e miscigenada, vai encontrar no sebastianismo português a origem comum desse problema.
Recorrendo a analogia de Gilberto Freyre, da neurose sádica do senhor e masoquista do escravo, do conquistador e do conquistado, talvez possamos ver com alguma clareza a razão desse problema. Tanto os brasileiros como os portugueses sofremos desses complexos; de colocarmos as responsabilidades de lado e esperar que alguém venha nos socorrer, de cair em cima do mais fraco ao mesmo tempo que nos borramos diante do mais forte. Isso está enraizado na nossa visão de que haverá sempre um mandão em nossas vidas, sem que nada possamos fazer, e até mesmo gostarmos um pouco disso, como masoquistas, que esse mandão nos maltrate e por isso fazermos beicinho...
"Menos a vontade de reformar ou corrigir determinados vícios de organização política ou económica que o puro gosto de sofrer, de ser vítima, ou de sacrificar-se" - volto a Freyre que nos conhecia tão bem.
Podemos também por comparação com outros povos que desenvolveram-se mais rápido, encontrar outras causas para essa diferenciação. Tanto na religião, que por um lado trocou a passividade do catolicismo pela ação do protestantismo, como pela troca do regime de governo, que impôs menos poder ao mandão por um lado e uma abrupta substituição de mandões por outro. É no mínimo curioso constatar essa relação entre a cultura e o comportamento psicológico. Será que esse doente tem cura? Apesar de "ainda sermos os mesmos e vivermos como os nossos pais" não quer dizer que não possamos melhorar, melhor dizer, queiramos melhorar.
É preciso ver bem isso, sentir, indignar-se, inconformar-se, protestar, e não cruzar os braços até a resolução do problema. Não podemos viver nem estamos fadados a morrer assim. Não há ninguém que possamos responsabilizar por esse estado de coisas senão nós mesmos, e se cada um tratar a sua parte, o todo fica tratado. Por que razão alguém (ou um povo) que se considere maduro quereria continuar a se comportar de forma infantil? Em que somos assim tão diferentes dos outros? Nada! Não há desculpas a dar nem alguém em quem botar a culpa! Já está mais do que na hora de assumirmos isso. Quantas gerações ainda faltarão? Ou cuidamos de nós como queremos ou haverá sempre alguém que o faça à sua maneira. O que prefere?



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